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quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Tempo ocioso é fundamental para revigorar o corpo e a mente

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Postado por talita em janeiro 31, 2013 às 10:21 am em Saúde | Nenhum comentário

sa63 Tempo ocioso é fundamental para revigorar o corpo e a mente [1]

Executar atividades conhecidas como um "sinal de tédio" pode fazer com que as pessoas fiquem fisicamente alertas. Foto: Kaptain Kobold

 

Vida corrida, horário para chegar e para sair, vício do celular e redes sociais, TV ligada, buzinas e 1001 coisas para fazer. Que tal deixar tudo isso de lado e induzir o cérebro ao descanso, sonhar acordado e se desligar de tudo por algum tempinho? Embora não pareça, o tempo ocioso é fundamental para a revigoração do corpo e da mente.

Pesquisadores norte-americanos defendem que o tédio é uma maneira do cérebro comunicar que a pessoa deveria estar fazendo alguma coisa e, por isso, há mais chances de aprender como se divertir e ganhar auto-controle.

O professor de neurociência Mark Fenske, da Universidade de Guelph, em Ontario, explicou ao jornal New York Times, que executar atividades conhecidas como um "sinal de tédio", a exemplo de fazer rabiscos, pode fazer com que as pessoas fiquem fisicamente alertas. Ele também comentou que a inquietação das crianças com o tédio pode ajudá-las a intensificar os aprendizados e absorver mais informações.

De acordo com uma pesquisa, publicada no segundo semestre de 2012, no periódico Perspectives on Psychological Science, quando as pessoas estão descansando ou desligados das atividades cotidianas, o cérebro entra no chamado "modo padrão" ou "default", que está relacionado aos componentes do funcionamento socioemocional, como autoconhecimento, julgamentos morais, desenvolvimento do raciocínio e construção de sentido do mundo que nos rodeia.

"O foco para dentro afeta a maneira como construímos memórias e sentidos e o modo como transferimos o que aprendemos para novos contextos. O equilíbrio é necessário entre a atenção exterior e interior, já que o tempo gasto com a mente vagando, refletindo e imaginando também pode melhorar a qualidade da atenção externa que as crianças podem sustentar", explicou uma das autoras da pesquisa, a professora Mary Helen Immordino-Yang, da Universidade do Sul da Califórnia.

* Publicado originalmente no site EcoD [2].


Artigo impresso de Envolverde: http://envolverde.com.br

Endereço do artigo: http://envolverde.com.br/saude/tempo-ocioso-e-fundamental-para-revigorar-o-corpo-e-a-mente/

Endereços neste artigo:

[1] Imagem: http://envolverde.com.br/portal/wp-content/uploads/2013/01/sa63.jpg

[2] EcoD: http://www.ecodesenvolvimento.org/posts/2013/janeiro/tempo-ocioso-e-fundamental-para-revigorar-o-corpo?tag=vida-e-saude




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Como fazer uma reunião produtiva?

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Quem nunca achou que a reunião se estendeu por mais tempo do que deveria ou não teve propósito nenhum? Veja algumas técnicas para evitar que isso aconteça

Definição de metas, divisão de trabalhos ou informar sobre os resultados de uma ação. Essas razões, entre outras várias, podem demandar reuniões. No entanto, nem sempre esses encontros representam soluções para os problemas de uma companhia e sim mais um entrave na realização das tarefas.

Quem nunca achou que a reunião se estendeu por mais tempo do que deveria ou não teve propósito nenhum? As razões para essa insatisfação, de acordo com o consultor em estratégia nos negócios Leonardo Fuerth, em seu livro Técnicas de reunião, podem ser condensadas em quatro aspectos: "falta de preparo, conflito espaço-temporal, reunião mal desenvolvida e comportamentos inadequados".

Para minimizar problemas como esses, evitando que as reuniões se desvirtuem do seu papel de solucionadoras de questões, tornem-se empecilhos e perda de tempo para gestores e colaboradores, a Administradores vai lhe dar uma ajudinha. Elaboramos, em conjunto com a consultora organizacional Sônia Jordão, dicas tanto para quem conduz o encontro, como para os participantes.

Quem conduz

1- Selecione os participantes do encontro

Convoque ou convide para participar da reunião somente as pessoas que tenham interesse no assunto.

2 - Explique previamente o motivo, explicitando seus desdobramentos

Informe o tema a ser discutido com antecedência para que as pessoas se preparem para a reunião. Além disso, ao iniciar o encontro, esclareça suas razões e verifique se os participantes compreenderam, questionando as causas ou problemas do assunto em pauta.

3 - Acompanhe para que não haja fuga do tema/gerencie o tempo

Procure manter o foco da reunião, garantido que seja rápida e com exposições sucintas, intervindo quando algum participante se prolongar, falar com muita frequência ou sair do tema. 

4  - Incentive a participação de todos

Peça aos demais soluções possíveis e estimule a participação de todos, buscando ter as evidências que comprovem a praticidade de cada proposta, evitando questionar diretamente cada participante. É preciso que cada uma das soluções levantadas tenha um responsável e limite de tempo para que sejam realizadas.

Quem participa

1- Organize-se para a reunião

Chegue no horário marcado e leve para a reunião tudo que sabe a respeito do tema a ser discutido.

2- Participe ativamente da reunião

Externe suas opiniões e soluções, mas seja breve, utilizando um tom de voz moderado. Explique e esclareça suas propostas, além de apoiar sugestões que levem a uma solução coerente. Anote tudo o que for de seu interesse e evite conversas paralelas. Além disso, assuma as responsabilidades inerentes às suas funções.

3- Saiba ouvir

Escute com atenção o que falam outros participantes e não interrompa quando alguém estiver com a palavra. Caso discorde das ideias de outro, não discuta, mas pergunte o motivo pelo qual o colega pensa de maneira diferente. 

4 – Cuidado com o celular

Não tem coisa mais chata em uma reunião do que ser interrompido por um toque de celular. Desligue ou deixe o aparelho no silencioso durante a reunião.


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sábado, 26 de janeiro de 2013

Megaprojeto privado cria rota exportadora no Norte

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Megaprojeto privado cria rota exportadora no Norte

24 de janeiro de 2013

Empresas privadas lançaram um megaprojeto para criação de um novo corredor logístico, capaz de escoar até 20 milhões de toneladas de grãos do Mato Grosso pela Região Norte. O plano se tornou viável com o avanço das obras de pavimentação da BR-163 e vai exigir investimentos de R$ 3 bilhões na construção de estações de transbordo, armazéns, terminais portuários, empurradores e barcaças.

O plano abre uma nova rota para a exportação de soja e milho colhidos no Médio-Norte do Estado, nos municípios de Sinop, Sorriso, Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, cortados pela BR-163. Hoje, praticamente toda a safra na região é escoada a custos elevados pelos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR), a mais de 2 mil quilômetros de distância.


Boa parte dos recursos privados deve ser investida no município paraense de Itaituba, especificamente no distrito de Miritituba, na margem direita do Tapajós, próximo ao entroncamento entre as rodovias BR-163 e BR-230, a 900 quilômetros do cinturão agrícola. O município será uma espécie de "hub", capaz de receber a produção da região e distribuí-la, em comboios de barcaças, para os grandes portos fluviais exportadores da Bacia Amazônica.

Pelo menos oito empresas já adquiriram terrenos em Miritituba para a construção de estações de transbordo. Quatro delas – as tradings americanas Bunge e Cargill e as operadoras logísticas Hidrovias do Brasil e Cianport – possuem projetos em estágio final de licenciamento ambiental e devem iniciar obras ainda neste ano. As quatro devem investir, no total, R$ 600 milhões em Miritituba e mais R$ 1,4 bilhão na construção dos comboios de barcaças e em aumento de capacidade de seus terminais nos portos de destino.

Para representar os interesses das empresas com planos de investimento no novo sistema, foi criada no ano passado a Associação dos Terminais Privados do Rio Tapajós (Atap).

Por: Gerson Freitas Jr.  
Fonte: Valor Econômico

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Fwd: O rio que voa sobre nós

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Água
23 de Março de 2011
postado por Redação EcoD

TEDx Amazônia Antonio Donato Nobre: O rio que voa sobre nós

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Um rio maior que o Amazonas e responsável pelo abastecimento de água doce de todo o sudeste da América Latina está seriamente ameaçado. Esse rio, invisível para muitos, sobrevoa todo o país diariamente, despejando 20 bilhões de toneladas de água doce em uma região que é responsável por 70% do Produto Interno Bruto (PIB) da América do Sul.

Ainda assim, pouco valor é dado a esse rio e, mais grave ainda; existem dezenas de projeto que irão destruir, pouco a pouco, essa fonte incalculável de vida. É sobre esse fenômeno que o climatologista Antonio Donato Nobre debate nesta palestra do TEDx Amazônia.

Esses rios de vapor, produzidos graças à transpiração das 600 bilhões de árvores que habitam a Amazônia, fazem com que a água jorre do solo para o céu em uma quantidade gigantesca.

Para se ter noção, o Rio Amazonas, maior manancial do mundo e responsável por 1/5 de toda a água doce que sai dos continentes e chega aos oceanos, despeja diariamente 17 bilhões de toneladas de água doce no oceano Atlântico, 3 bilhões a menos que os rios voadores.

Além do grande volume de água, as árvores fazem esse trabalho utilizando apenas a luz do sol, o que torna seu trabalho ainda mais eficiente. Segundo Nobre, caso o homem tentasse fazer algo do tipo, ele precisaria de 50 mil usinas como a Itaipu para gerar energia suficiente para evaporar toda essa água.

"Paradoxo da sorte"

Mas por que esse rio é tão importante para nós? Segundo o especialista em clima, no Brasil existe algo que ele batizou de "Paradoxo da sorte". Estudos comprovaram que as regiões localizadas a 30 graus de latitude ao norte e ao sul das florestas equatoriais são desertos. A única exceção em todo o mundo está no quadrilátero que vai de Cuiabá a Buenos Aires, e de São Paulo aos Andes.

A responsável por esse fenômeno é exatamente a "bomba biótica de umidade", ou seja, os rios voadores que são produzidos na Amazônia e sugados para dentro do continente, "pulsando sobre essa região como se fosse a circulação sanguínea de um corpo".

Para Nobre, observar essa "poderosíssima usina de serviços ambientais" e entender como ela funciona é a única maneira de recuperar o planeta. O climatologista acredita que restabelecendo as florestas é possível recuperar outras áreas, inclusive desertos e, assim, reverter o clima e o aquecimento global.

O palestrante cita uma conversa que teve com Davi Copenaua, representante do povo Yanomâmi. "Ele falou: 'Será que o homem branco não sabe que se ele tirar a floresta vai acabar a chuva? E se acabar a chuva ele não vai ter o que beber nem o que comer?'. 

Quando eu escutei aquilo eu fui às lágrimas porque passei anos estudando isso, com super computadores, dezenas, milhares de cientistas, e a gente só está começando a chegar a essa conclusão e ele já sabe. Com um agravante, os Yanomami nunca desmataram, então como eles podem saber que acaba a chuva?", conta.

Impactado com a simplicidade e grandeza da sabedoria do líder, ele refletiu sobre como a sociedade ocidental, civilizada, precisa mudar seus conceitos e começar a ver as coisas com seus próprios olhos, "ou vamos continuar vivendo na ignorância".

Nobre conclui sua palestra fazendo uma proposta aos ouvintes: "Vamos virar o Hubble (Telescópio Espacial) de ponta-cabeça, e vamos fazê-lo olhar para cá, e não para os confins do Universo. Vivemos num Cosmos desconhecido e estamos tripudiando esse Cosmos maravilhoso que nos dá morada e abrigo. Vamos olhar para a Terra e vamos começar pela Amazônia. Vamos olhá-la bem de perto, já que a gente precisa disso".

Por fim, ele lembra que os seres humanos tem a "arrogância da tecnologia" e esquecem o nível de evolução da natureza. Para Nobre, as células-vivas são a base de existência de todas as maravilhas do mundo. "Todos nós temos 100 trilhões dessa máquina no nosso corpo, imagina o que tem lá na floresta Amazônica", conclui.

Assista à palestra na íntegra:

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Slavoj Zizek e a novidade do comunismo

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Enviado por Miguel Conde -28.05.2011 |09h30m


 

Sentado num hotel em Copacabana, um dia após fazer uma palestra sobre os impasses da democracia liberal para um Odeon lotado (a convite da PUC-Rio, Uerj, Boitempo e Flacso), o filósofo esloveno Slavoj Zizek parece tomado por um excedente de energia que o deixa num estado próximo à convulsão: durante uma hora de entrevista sobre seus livros “Em defesa das causas perdidas” e “Primeiro como tragédia, depois como farsa” (Boitempo, tradução de Maria Beatriz de Medina), seus braços se lançam em todas direções possíveis pontuando as respostas aceleradas, cheias de parênteses, diálogos encenados e exclamações. Ao mesmo tempo enfática e digressiva, a fala é fiel aos textos que fizeram de Zizek uma referência para a esquerda mundial, nos quais uma aproximação original dos pensamentos de Marx e Lacan serve de ferramenta para um ímpeto aparentemente inesgotável de interpretação crítica da cultura moderna e contemporânea, dos filmes de Hollywood aos pressupostos da democracia representativa até o pensamento de Deleuze ou Antonio Negri. Nessa entrevista ao GLOBO, Zizek explica (entre outras coisas) o que significa hoje ser comunista, e por que é preciso recuperar a ideia de revolução.

Seu livro “Em defesa das causas perdidas” começa pela constatação de que a ideia de revolução está hoje desacreditada no debate político. Esse descrédito, o senhor argumenta, não se explica simplesmente pelo fim da União Soviética ou pela queda do Muro de Berlim, como muitas vezes se diz. Ele estaria ligado a diversas críticas feitas no século XX às noções de verdade e totalidade. Quais são os principais argumentos dessas críticas, e como o senhor pretende contestá-los?
SLAVOJ ZIZEK: Há uma certa moda na filosofia pós-moderna de se tomar a verdade como algo opressivo, que deve ser subvertido. Questiona-se: “quem tem o direito de dizer que algo é verdade?” Em vez da verdade, existiriam apenas opiniões. Até as ciências naturais são tomadas como um fenômeno discursivo, que não teria nenhuma diferença de princípio em relação a superstições e formas de conhecimento baseadas na tradição. Discordo disso. Penso que existe a verdade, que existe a verdade universal, e que ela pode mesmo ser vista politicamente. Por exemplo, o que aconteceu recentemente no Egito foi a universalidade em sua forma mais pura. Não precisamos de nenhuma teoria multiculturalista para entender o que se passava nas ruas do Egito. Quando você tem uma rebelião pela liberdade, pode se identificar com ela de maneira imediata. Quanto à totalidade, esse é um grande mal entendido. A noção hegeliana de totalidade não significa que todos fenômenos particulares sejam no fundo parte de um mesmo todo orgânico. Não! Se você lê Hegel, vê que totalidade é quase o oposto disso. A totalidade é uma categoria crítica, que implica perceber as maneiras pelas quais um certo fenômeno dá errado como sendo parte da essência desse fenômeno. Detesto os marxistas que dizem: “Stalin traiu o verdadeiro espírito do marxismo”. Não, não se pode permitir que isso seja dito. Se as coisas deram tão terrivelmente errado com Stalin, isso significa que havia uma falha estrutural no próprio edifício de Marx. Não acredito nessa baboseira do tipo “a ideia era boa mas infelizmente foi mal realizada”. Aqui eu sou freudiano. O resultado da ideia é como um sintoma, que aponta para algo errado na ideia. Não acho que os liberais de hoje consigam admitir isso. Por exemplo, tive um debate na França com Guy Sorman, um defensor radical do capitalismo e ele dizia: “capitalismo significa justiça e democracia”. Então eu perguntei, “mas e a China hoje?”, e ele respondeu “Ah, mas isso não é capitalismo”. Isso é um pouco fácil demais. Quando você tem um capitalismo que não se encaixa no seu ideal, você diz “não, não, não é disso que se trata”. É como a piada contada por Lacan, “meu noivo nunca está atrasado pois no momento em que se atrasa ele deixa de ser meu noivo”. Claro que você pode dizer, “o comunismo é sempre democrático pois no momento em que não é democrático ele deixa de ser comunismo”. Ok, mas isso é fácil demais.

O senhor no entanto sugere em seu livro que as revoluções são violentas apenas quando não são de fato revolucionárias. Ou seja: quanto mais revolucionária for uma revolução, menos violenta ela será num sentido estrito. Poderia falar sobre isso?

ZIZEK: Escrevi num outro livro algo que me deu muitos problemas: eu disse, “o problema de Hitler é que ele não foi violento o bastante”. E as pessoas ficaram “aaai, você queria que ele tivesse matado todos os judeus?!” Não! Ele não foi violento o bastante nesse sentido autêntico, revolucionário, em que a violência significa transformação das relações sociais, e não tortura ou assassinato. Hitler matou milhões de judeus em nome da manutenção do sistema. O que estou dizendo é que não quero dar a Hitler sequer esse crédito, na linha “ele foi um criminoso, mas era um líder corajoso”. Não, ele não era. Nesse sentido, Mahatma Gandhi foi mais violento do que Hitler. Gandhi é sem dúvida um modelo de paz, mas nesse sentido básico ele foi violento, organizou protestos de massa com o objetivo de impedir o funcionamento do Estado colonial inglês na Índia. Isso é algo que Hitler nunca ousou fazer.

Os críticos da totalidade apontam um outro tipo de violência, que é a violência das ideias. Toda revolução tem pelo menos dois momentos. Um de suspensão total daquilo que é dado, o que o senhor chama de “evento”, citando o termo usado por Alain Badiou. E um segundo momento de estabelecimento de uma nova ordem. É este segundo momento que é percebido como inerentemente violento, na medida em que a nova ordem é estabelecida a partir de abstrações totalizantes que são impostas à sociedade.

ZIZEK: Sim, essa é a crítica padrão, iniciada por Edmund Burke e Joseph de Maistre. Mas, escute. A violência emerge, admito, como uma limitação desses modelos abstratos. Mas acho que essa análise é muito simplista. Há revoluções, afinal, que são bem sucedidas. Veja o milagre da democracia. Sou um crítico das democracias atuais, mas a ideia de democracia é um exemplo maravilhoso de como algo que era percebido na sociedade pré-moderna como o maior momento de perigo e instabilidade pode se tornar parte da estabilidade do novo sistema. Na época das monarquias, ou mesmo nos regimes totalitários, o momento de maior perigo se dá quando o líder morre e o trono fica vazio. Na União Soviética, quando Stalin morreu, mantiveram a morte em segredo por três dias. A ideia da democracia, no entanto, é muito engenhosa. Ela diz: “e se, em vez de tratar o fato de que o trono está vazio como um problema, nós o considerarmos uma solução? O trono está originariamente vazio, e apenas algumas pessoas eleitas democraticamente podem ocupá-lo por um certo período de tempo, de forma limitada. Ninguém tem um direito natural a ocupar o espaço do poder”. Esse é para mim um ótimo exemplo de algo que parecia violento e se torna o próprio fundamento da estabilidade. Então concordo que há um perigo das ideias, mas acho que o dia seguinte é a parte mais importante das revoluções. Não me sinto fascinado por esses momentos de grande mobilização onde todos estão nas ruas, juntos, pedindo mudança. Isso sempre me lembra da França, onde todo conservador hoje, a começa por Sarzoky, diz: “claro, em 1968 eu estive nas barricadas”. O que me interessa é o dia seguinte. A violência do dia seguinte é sinal de uma falha, mas não há sempre necessariamente violência. Se aqueles no poder resistem, é claro que deve haver alguma violência, mas apenas como forma de defesa.

O senhor argumenta, porém, que no interior do horizonte da democracia só é possível pensar em mudanças parciais, reformas...

ZIZEK: Não, aqui serei bem específico. Falo do horizonte da democracia atual. O problema é como revitalizar a democracia. Mesmo Badiou, que às vezes disse coisas malucas, como “o nome do inimigo hoje é democracia”, já especificou essa declaração, explicando que o que ele critica é o modelo atual de democracia representativa. Vou dar um exemplo. Estive na Inglaterra anos atrás, nas últimas eleições vencidas pelos Trabalhistas, quando Blair ainda era o líder do partido. Duas semanas antes da votação, houve na BBC uma grande eleição pública para se escolher a pessoa mais odiada da Inglaterra. Sabe quem ganhou? Tony Blair. E duas semanas depois, Tony Blair foi eleito. O que isso mostra? Mesmo críticos conservadores admitem isso: há uma disfunção da democracia, uma certa quantidade de energia de protesto, frustração, insatisfação, que não pode ser capturada por esses modelos tradicionais puramente partidários e representativos. E então há reações distintas a isso. Desde os “movimentos de uma questão só”, como um movimento pela redução de certos impostos, até essas revoltas aparentemente irracionais, como a queima de carros nos subúrbios de Paris. Isso deveria preocupar qualquer democrata sincero hoje. Como tornar o sistema democrático mais eficiente, de modo que não se tenha explosões de descontentamento que dão expressão a uma energia não capturada pela representação política?

Mas a criação de novos canais de expressão ou atuação política pode ser defendida dentro de uma agenda democrática puramente reformista. Por que seria necessário então recuperar, como o senhor propõe, a noção de revolução?

ZIZEK: Mas espere um minuto, por revolução não quero dizer estado de emergência, polícia revolucionária etc. Por revolução quero dizer apenas, num sentido puramente formal, mudança radical. Talvez nem mesmo uma mudança radical veloz. A revolução seria, simplesmente, por exemplo, que as pessoas no Japão ameaçadas pela radiação nuclear se unissem e exigissem algum tipo de regulação internacional eficiente... Revolução para mim é mudança nas relações sociais de poder.

Um lento processo de transformação não seria o oposto do “evento”, do qual fala Badiou?

ZIZEK: Badiou é muito preciso: para ele, um evento é algo que só pode ser reconhecido retroativamente. E aqui entra o que ele chama de fidelidade ao evento. Não é o grande evento, mas esse trabalho paciente de busca por novas formas, a reinscrição do evento na forma do ser, da vida cotidiana. Para mim, foda-se a revolução, o que me interessa é aquilo que permanece. Não ligo para o que aconteceu na Praça Tahrir. O que me importa é o que vai permanecer daquilo daqui a cinco anos. Nesse sentido, o evento é apenas um ponto de início mítico que abre um certo horizonte de atividade política, e esse é o verdadeiro trabalho, lento e duro. Badiou faz uma referência maravilhosa na qual ele lê esse processo revolucionário segundo as qualidades cristãs definidas por São Paulo: fé, esperança e amor, das quais o amor é a mais importante. Badiou diz: fé é a fé no evento, no sentido de que algo novo é possível; esperança é a esperança de que chegaremos ao objetivo; e amor é para Badiou, como disse São Paulo, o trabalho do amor. O que significa trabalho paciente. É disso que precisamos hoje. Deixe-me dar um exemplo: Obama. Gostei de Obama no começo, e mesmo agora ainda gosto dele em alguma medida, mas sabe por quê? John McCain falava uma língua que para mim era revolucionária de modo apenas superficial. Ele dizia “temos inimigos, como a burocracia, devemos combatê-los e tudo vai dar certo”. Obama, por sua vez, dizia: “nós temos problemas sérios e o que precisamos é de trabalho paciente”. Essa reabilitação do trabalho cinzento diário, talvez a esquerda precise de um pouco disso, não?


O comunismo vai vencer, como o senhor disse ao jornal inglês “The Guardian”?

ZIZEK: Ah, isso é uma provocação. Quis dizer: o comunismo vai vencer ou então estaremos todos na merda. Você tem que dizer algo assim de vez em quando para fazer as pessoas pensarem. Ainda sou um comunista, mas não um continuísta. O século XX acabou. O resultado geral do comunismo foi um fiasco. A social-democracia foi boa enquanto funcionou, mas está hoje em crise. E a lição do sucesso econômico da China e de Cingapura é que o casamento aparentemente eterno entre capitalismo e democracia está se desfazendo. Temos aqui uma forma de capitalismo ainda mais dinâmica do que o capitalismo ocidental, e que funciona perfeitamente em condições autoritárias. Isso deveria nos preocupar. A razão por que me considero ainda um comunista é que vejo uma série de problemas para os quais não há solução possível dentro do modelo do capitalismo liberal global. Entre eles, a questão ambiental, a biogenética, a propriedade intelectual. Para enfrentá-los vamos precisar de um esforço coordenado de larga escala, algo de que nem o mercado nem o Estado tradicional são capazes. Quando as pessoas me dizem “você é um utópico”, eu digo: “a única utopia de fato é acreditar que as coisas podem seguir indefinidamente seu curso atual”. É claro por exemplo que se a China continuar se desenvolvendo na escala atual haverá uma demanda materialmente impossível de se atender. Para mim, comunismo é o nome de um problema. Todos esses problemas são problemas de algo comum (“problems of commons”), de algo que deveria ser compartilhado por todos nós. É uma alegação muito modesta.

De bem com a natureza

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Continuando a discussão....que futuro e que estilo de vida queremos para nós e nossos descendentes? O que é, efetivamente, desenvolvimento e qualidade de vida?

O e-mail abaixo recebi de um grupo do qual faço parte de discussão sobre o taoísmo e o I Ching.


Leiam a opção de vida simples que está inspirando milhares de pessoas pelo mundo! E você como vai construir seu futuro?

Ely

De bem com a natureza

No final do milênio, a Terra continua pedindo socorro, mas a consciência a respeito dos perigos provocados pelo descuido com a natureza já mudou o cotidiano de muita gente. Talvez você não tenha nem percebido.

              por Mariana Barbosa, de Londres

Lembra-se daquele sujeito que largou o emprego para montar uma pousada na praia? Ou daquele que decidiu morar numa cidade menor para ter mais contato com a natureza? Pois é, essa gente está cada vez menos sozinha.

 

A constatação de que dinheiro não traz felicidade engrossa neste final de milênio a lista dos que buscam um cotidiano mais simples e respeitoso com a natureza. A tendência é suficiente para fazer soar os alarmes dos economistas. Em 1996, o The Wall Street Journal, principal jornal financeiro americano, alertou que a onda de consumo frugal e seletivo poderia afetar o ritmo de crescimento da economia dos Estados Unidos. Naquele ano, de 5% a 10% dos trabalhadores do país optaram por ganhar menos trabalhando menos. E a tendência continua.

"Eles não são ecologistas de carteirinha, mas retomam a bandeira de redução do consumo por um estilo de vida autônomo e com menos impacto no planeta", disse à SUPER Stephan Harding, professor de Ciências Holísticas do Schumacher College, na Inglaterra, uma das instituições mais respeitadas no estudo do ambientalismo.

Essa é a principal bandeira da Ecologia Profunda. A corrente de pensamento criada no início dos anos 70pelo filósofo norueguês Arne Naess acrescentou uma dimensão ética e filosófica ao discurso ambientalista.

Hoje, quase trinta anos depois, pode-se dizer que a Ecologia Profunda pegou. Além das atitudes individuais, organizações de defesa ambiental investem mais em assuntos de relevância global do que em campanhas do tipo "salve as baleias". Transformado em filosofia, o ecologismo de Naess entrou de mansinho nas casas. Agora, os moradores podem olhar mais tranqüilos pela janela.

Um jeito de ser

Veja como a consciência ambiental transforma o dia-a-dia.
1. Experiência
 Uma situação de contato com o ambiente desperta a consciência para a natureza e para o fato de que somos apenas uma parte dela.

2. Questionamento
A experiência leva à percepção da degradação ambiental e ao questionamento sobre o lugar do homem no centro de tudo.

3. Compromisso
O pensamento ecologicamente correto inspira a ação, as mudanças no cotidiano que vão preservar o ambiente.

A preocupação com a natureza está presente em casa e no trabalho. Todos querem escritórios ou oficinas saudáveis. Há muitas opções profissionais ecológicas. Um advogado pode se especializar na legislação da área e um empresário de turismo investir em roteiros ecológicos. Preferir frutas e verduras da época e tradicionais da região em que se mora virou questão de bom senso.

Ter filhos depois dos 30 anos virou algo comum. Um só, de preferência.

Muitos se associam a entidades ecológicas. Ou fazem propaganda delas. Fins de semana e férias são cada vez mais voltados para o contato com a natureza.

Já não é difícil ver gente indo para o trabalho de bicicleta, dando ou pedindo carona.

Reciclar o lixo, consertar eletrodomésticos quebrados e usar roupas até o limite são tendências difundidas.

Algo mais

Para o fundador da Ecologia Profunda, o filósofo norueguês Arne Naess, o único jeito de sensibilizar o homem para o problema ambiental é dar a ele, desde criança, a chance de entrar em contato com a natureza. Não faz mal que seja apenas com um pedaço dela. O importante é que esse pedaço não esteja sob o domínio do homem.

Radicalismo é um perigo a ser combatido

Para se tornar adepto da Ecologia Profunda é preciso desenvolver aquilo que Arne Naess chama de "sabedoria ecológica", a soma de uma experiência individual intensa de contato com a natureza com uma atitude crítica e engajada. O resultado é um conjunto de idéias que boa parte dos ecologistas já adotou. "Nossa atuação é holística, tentamos pensar a natureza como um todo", disse à SUPER o porta-voz do Greenpeace, maior organização do ramo no mundo, o inglês James Williams.

Mas há riscos. Como são muito amplas, as idéias de Naess podem dar margem a interpretações errôneas. Nos anos 80, por exemplo, Dave Foreman, líder do grupo radical Earth First, ficou famoso pelo infeliz comentário sobre o povo da Etiópia: "Que morram de fome. É a natureza buscando seu equilíbrio natural". "Isso é um absurdo", diz Stephan Harding. "Não tem nada, nada a ver com o que prega a Ecologia Profunda."

Oito mandamentos

As bases da Ecologia Profunda.
1. Todas as formas de vida possuem valor independentemente de sua utilidade para o homem. (Formas de vida são também rios, montanhas, ecossistemas, culturas e o próprio planeta.)

2. A riqueza e a diversidade da natureza têm valor intrínseco e contribuem para o bem-estar da vida na Terra. (Não adianta preservar pequenas reservas, é preciso haver abundância.)

3. Seres humanos não têm direito de reduzir essa riqueza, a não ser para satisfazer necessidades vitais. (A definição dessas necessidades deve levar em conta as características econômicas e sociais de cada povo.)

4. O impacto da interferência do homem é excessivo e a situação piora bem depressa. (É preciso reduzir o consumo nos países ricos.)

5. Para que a vida de todo tipo possa florescer, a população humana deve ser reduzida. (Estratégias de controle devem ser discutidas e desenvolvidas abertamente, sem radicalizações.)

6. As estruturas econômicas, tecnológicas e ideológicas devem ser reformuladas. (O crescimento econômico difundido pelos países industrializados é incompatível com as formulações anteriores.)

7. Mudanças ideológicas são fundamentais para melhorar a qualidade da vida. (Não confundir qualidade, que não se mede, com padrão de consumo.)

8. Quem concorda com as formulações anteriores deve contribuir para implementar as mudanças necessárias. (Só as ações pacíficas são bem-vindas.)

Rebelde com causa

Hoje com 87 anos, Arne Naess, o filósofo mais famoso da Noruega, animador da ecosofia, teme o século XXI.
Professor de Filosofia da Universidade de Oslo de 1939 a 1969, Arne Naess foi preso várias vezes. Na década de 40, porque liderava protestos contra a Segunda Guerra Mundial. Nos anos 60, por manifestações contra a construção de uma usina hidroelétrica em seu país.

Órfão de pais e mãe, Naess despertou cedo para o montanhismo. Mas se cansou de competir e resolveu passar a "honrar", em lugar de "conquistar", os montes. No alto deles, no centro de seu país, o Hallingskarvet, construiu um chalé onde, desde 1938, passa três meses por ano. Ali elaborou as bases da Ecologia Profunda, inspirado pelas idéias do filósofo holandês Barch de Spinoza (1632-1677) e pela desobediência civil pacífica do líder indiano Mahatma Gandhi (1869 - 1948). Mas não conseguiu seu próprio conselho em relação ao controle populacional. Teve três filhos. Ainda hoje se aventura nas montanhas ao lado da Quarta mulher, a filósofa Kit-Fai, 37 anos mais jovem. Sua cabeça, assim como o corpo, continua em ótima forma. Ele dá palestras pelo mundo e está escrevendo um livro sobre Spinoza.

A casa em que mora, num subúrbio de Oslo, revela o conforto e o estilo "natural" da classe média européia. Com uma calça remendada e tomando chá em uma xícara térmica de quase quarenta anos, Naess recebeu a SUPER para a seguinte entrevista:

SUPER - Como o senhor vê o futuro do planeta?
Arne Naess - Estou pessimista com o próximo século. Todo mundo quer adotar um alto padrão para o seu cotidiano e isso não deixa ninguém mais feliz, só piora a situação da Terra. Mas eu acredito que no século XXII as pessoas estarão vivendo melhor e de um jeito mais simples.

Como o senhor imagina o século XXII?
Imagino um mundo dividido em unidades pequenas. Mas não será uma anarquia. Continuaremos precisando de governos democráticos para dar apoio às artes, às ciências, às universidades.

O que mudou desde o surgimento do ambientalismo?
A quantidade de gente consciente tem crescido, mas os problemas também. Há uma forte internacionalização dos mercados e continuamos emitindo níveis insustentáveis de poluentes.

Será preciso uma catástrofe para mudar isso?
Espero que não. Mas, só quando sérios problemas afetarem o estilo de vida nos países ricos - com muito consumo e impacto exagerado no ambiente - , deverá se generalizar a consciência de que esse modelo é impraticável. Nós, do Primeiro Mundo, precisamos mudar e cooperar com o Terceiro Mundo para que seu povo não caia no falso ideal. Somos os responsáveis pela crise. Cem bebês em Bangladesh causam menos impacto que um bebê americano ou norueguês.

A população já chegou à marca dos 6 bilhões. Como o senhor vê isso?
Não é "o" grande problema. Se não for discutido junto com outros problemas, como o nível de consumo nos países ricos, não chegaremos a lugar nenhum. Talvez uma solução seja dar incentivos fiscais para alcançar a redução populacional. Quem não tem filhos poderia receber 20% a mais de aposentadoria em recompensa por ter causado um impacto menor.

O homem deve abrir mão do papel principal
Sempre houve gente preocupada com o ambiente. Mas foi só em 1962, quando a bióloga americana Rachel Carson denunciou o risco dos pesticidas para a saúde pública, que o pensamento ambientalista começou a ser formulado. Até então, a natureza era vista como inesgotável. Depois, a ênfase no crescimento econômico passou a ser questionada até que se chegasse à Ecologia Profunda. Tentativas de conciliar os extremos não tiveram sucesso. O que continua fértil é a idéia de Arne Naess: para proteger a Terra, temos que ter a humildade de nos tornar coadjuvantes – e ir fundo nesse propósito.

Uma visão global

Economista alemão inspirou a Ecologia Profunda e a fusão da ciência com a filosofia.
Um dos primeiros livros a defender a redução do desenvolvimento e de seu impacto sobre o planeta foi Small Is Beautiful (Pequeno É Bonito), do economista alemão E.F. Schumacher (1911-1977). Mais tarde, em 1991, o nome do autor batizou o Schumacher College, no sul da Inglaterra, instituição acadêmica dedicada a promover a união entre a ciência e a filosofia. Seus cursos, especialmente o de mestrado em Ciência Holística, atraem gente do mundo todo. Entre os professores destacam-se o físico Fritjof Capra, o biólogo James Lovelock e o filósofo Arne Naess, todos famosos por suas idéias inovadoras.

fonte: revista super interessante  

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Irá a Alemanha “apagar” por causa das “energias renováveis”?

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Oi Turma,

Um excelente 2013 para todas e todos. Espero que tenham tido ótimas festas, com muita paz, saúde e alegrias, com suas famílias e amigos.

Estou reiniciando minhas atividades de envio de temas interessantes e polêmicos para nos mantermos alertas e bem informados com o que está ocorrendo no Pará, Brasil e no mundo.

O artigo que segue mostra bem que a questão da produção de energia em larga escala, como Belo Monte, está muito longe de uma solução, se é que haverá uma única solução, são transformações que a sociedade deverá promover nos próximos anos e conecer e discutir a questão é fundamental para o exercício da cidadania e formação de opinião.

Tudo de bom p vcs.



Posted: 12 Jan 2013 11:30 PM PST
Morbach: experiência válida para pequenas aldeias. Mas, e as grandes cidades?
Morbach: experiência válida para pequenas aldeias. Mas, e as grandes cidades?
Na pequena e simpática cidadinha de Morbach, na região de Hunsrück, 14 turbinas eólicas, quatro mil metros quadrados de painéis solares e uma estação de biogás – tudo instalado numa antiga base militar – produz o triplo da eletricidade de que a comunidade precisa.

Morbach é apresentada como o modelo de uma Alemanha sem usinas nucleares, as quais serão desativadas na sua totalidade em alguns anos, comentou a revista "Der Spiegel", ecoada pela agência Presseurop.

O plano de energias alternativas renováveis ajudaria a combater o "aquecimento global", tornaria o país independente do petróleo árabe e das chantagens da Rússia, além de exorcizar os medos de acidentes nucleares.

Morbach: do pequeno sucesso local ao sucesso nacional  há muito percurso a fazer
Morbach: do pequeno sucesso local ao sucesso nacional
há muito percurso a fazer
O plano marcaria quase o fim dos
combustíveis fósseis – carvão, petróleo e gás – usados nos últimos dois séculos.

O plano é muito atraente e "politicamente correto".

Porém, a realidade esta chiando e o governo tampa os ouvidos.

Os custos serão formidáveis e a Alemanha pode ficar aleijada energeticamente, com sua poderosa indústria condenada a fechar ou migrar.

Apesar dos conhecimentos e tecnologia atuais, a energia solar ainda é caríssima.

Onde está o sol no outono e no inverno alemão?

Os alegres ambientalistas não pensaram nisso?

As eólicas suscitam a antipatia crescente da população porque poluem intensamente a paisagem e são muito barulhentas para os moradores locais.

Além do mais, é preciso procurar muito longe ventos com a quantidade e força necessárias para torná-las viáveis.

A necessida obriga a ir até os países nórdicos e o próprio Mar do Norte.

Eolo é um deus caprichoso que sopra quando quer, deixando por vezes em apuros os mais sisudos climatólogos.

O que fazer quando o deus dos ventos dormita?

Tudo se passa como se jamais tivesse ocorrido aos militantes do ambientalismo a existência dessa evidência primeira. Para eles, o clima funciona como o ar condicionado: basta apertar um botão. Ou dar um clique no mouse.

O plano prevê a produção e acumulação de energia extra para as horas ou épocas em que Eolo ou Hélios não trabalhem.

Prevê-se bombear grandes quantidades de água em depósitos elevados nos momentos que há excesso de energia. Quando as forças naturais decidirem parar, então se faz descer a água para por em movimento geradores hidráulicos.

Mas eis um "pequeno detalhe" assaz importante: a Alemanha não tem superfície para esses depósitos de água. Os teóricos de gabinete mostraram nem conhecer a natureza e a geografia de seu país.

Der Spiegel: "O sonho caro de energia limpa"
Der Spiegel: "O sonho caro de energia limpa"
Para que funcione o belo e imenso plano, será preciso construir auto-estradas de energia – as linhas, as estações de comutação e transformação –, que custarão entre 40 a 53 bilhões de euros apenas nos próximos dez anos. Como se a Europa não estivesse em crise!

Em consequência, os estrategistas da RWE, a maior empresa alemã de energia, prevêem que o preço da energia vai subir 400% nos próximos 25 anos.

Acresce-se que é impossível calcular os custos exatos da revolução da energia verde nos próximos 40 anos.

E os militantes verdes parecem dispostos a dificultar os trâmites de aprovação dos projetos, promover disputas judiciais e protestos públicos, além de sabotagens ilegais por parte dos mais extremistas.

Os operadores de painéis solares recebem um subsídio muito acima do preço de mercado da eletricidade.

Quer dizer, entre 60 e 80 bilhões de euros nos últimos dez anos para cobrir apenas 1,1% das necessidades de energia elétrica da Alemanha.

E isso malgrado a Alemanha dispor por si só das instalações de células fotovoltaicas com uma capacidade equivalente à de todas as demais instalações repartidas pelo mundo.

A realidade e a geografia obstaculizam o utópico sonho.

Outro problema é que sendo a Alemanha muito povoada, e seu último metro quadrado aproveitado a fundo, ela não dispõe mais dos territórios onde instalar os caríssimos e até hoje pouco produtivos painéis solares.

Também quase não lhe resta mais espaço terrestre para as turbinas produtoras de energia eólica.

Parque de energia solar em Erlasee. Mas a Alemanha não tem o sol que necessitaria
Bonito parque de energia solar em Erlasee.
Mas, a Alemanha não tem o sol que o plano exige
Só fica o alto mar, onde os ventos são mais constantes, mas onde os custos de construção são muito mais caros.

O governo estima que a expansão ao alto mar custará entre 75 e 100 bilhões de euros até 2030, e confessa que os riscos de investimento são "difíceis de calcular".

Ou seja, serão muito maiores.

E a conta não pára de aumentar.

As auto-estradas de eletricidade para trazer a energia eólica do Mar do Norte custarão, segundo a Comissão Europeia, mais outros 500 bilhões de euros.

E será preciso investir ainda mais 50 bilhões para trazer energia solar do sul do continente.

Parque de energia eólica da Siemens no Mar do Norte.  E se o vento não soprar?
Parque de energia eólica da Siemens no Mar do Norte.
E se o vento não soprar?
Até 2050, o governo planeja um gigantesco crescimento do uso de biomassa: entre 13 a 17 vezes mais do que hoje.

Para isso, seria preciso converter muitos milhões de hectares de terra para a produção de energia.

O resultado seriam monoculturas de milho ou colza, que ameaçariam a "sustentabilidade ecológica".

E o quebra-cabeça – ou talvez o "quebra-Alemanha" – não faz senão começar.

A indústria é a maior consumidora de energia: um quarto da eletricidade e do gás da Alemanha. A indústria pesada emprega cerca de 875 mil trabalhadores.

No horizonte das "novas energias alternativas", o presidente do conselho de administração da BASF, Jürgen Hambrecht, teme uma "lenta desindustrialização da Alemanha".

As empresas se deslocam para onde é mais barata a energia e menor a hostilidade ambientalista.

Leia-se: fugirão para o exterior, deixando exércitos de desempregados em território alemão.

As energias renováveis demonstraram até agora ser viáveis só em pequenas localidades.

Verdes contra energia nuclear
Verdes contra energia nuclear
Para os ambientalistas radicais, o futuro será só o de pequenos grupos vivendo apenas do que produz a terra de sua comunidade e algum artesanato de tipo mais bem hippie. E mais nada.

Ou seja, é a sentença de morte contra a indústria alemã atual.

O custo da revolução verde será astronômico e talvez incontrolável para a indústria.

O investimento indispensável pode ser muito maior do que se imagina.

Entrementes, a grande indústria é diabolizada pelo ambientalismo radical: se ela vai para a falência, que se dane!

Se isso acontecer, a Alemanha não será mais a potência que é hoje.

Diminuída, empobrecida, com grandes contingentes populacionais desempregados, desvalorizados e substituídos por islâmicos, talvez ela não seja mais reconhecível no futuro.

Uma grande nação cristã poderá se apagar assim da história, para regozijo da "religião" ambientalista anticristã. Seria um crime inaceitável

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Henfil, cartunista que marcou toda uma geração

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Na sexta feira, 4/1/2013 são 25 anos, e nenhuma mídia lembrou....

domingo, janeiro 04, 2009

Hoje, em 1988, morria Henfil, o pai da Graúna e de tantos outros personagens. Nesta entrevista, publicada pela revista Caros Amigos, muitos anos depois da sua morte (e que republicamos agora), ele fala da sua infância, da ditadura, do medo da morte e de muito mais.
por Neusa Pinheiro

Neste mês, Henfil faria aniversário, nasceu em 5 de fevereiro de 1944. Morreria de Aids, como dois de seus oito irmãos, Mário e o Betinho. Hemofílicos, receberam na obrigatória transfusão a que se submetiam sangue contaminado.


Um quase homicídio de cada um. Henfil morreu aos 43 anos, em 1988. Esta entrevista foi feita em 1983 por Neusa Pinheiro e ficou guardada até agora com a intelectual e socióloga paranaense. Uma entrevista confessional, instigante e,muitas vezes, arrepiante.Ano: 1983. Sertaneja pé-vermelho, bicho do Paraná, resolvi me aventurar: Sampa, o centro nervoso espasmódico desta América. 

Talvez quisesse me diluir, me dissolver um pouco. Saber mais sobre o desamparo. Comecei chorando sobre o viaduto do Chá, com a chuva fina. Depois fui caminhando até escorrer bem devagar pela grandeza da avenida Paulista. Mundo pequeno. Cruzei um amigo, Ademir Assunção, jornalista, poeta. Sugeriu algumas estratégias de sobrevivência. Escrever, por exemplo. Entrevistar pessoas, ora. De cara, me passou o número do telefone de Henfil. “Henfil? Mas ele mora no Rio...” “Não, não, chegou aqui há poucas semanas, saúde precária, complicações da hemofilia, tratamento no Hospital das Clínicas etc.” Eu jamais havia entrevistado alguém. E agora? Logo o Henfil... Não podia ser o telefone da Rita Lee? Ou quem sabe o do Itamar Assunção, lá na Penha. Já conhecia o “nêgo Dito”, desde Londrina, era mais acessível... Era? Bom, e a Rita... loveLee Rita, como disse a Ná. Mas Henfil, Henfil era um mago desequilibrista. Na década de 70, num Brasil repressivo, desbancava consciências com seus cartuns – tanto o aspirante a uns poucos dias de clandestinidade, com planos cinematográficos de fuga, como o mais atuante e engajado dos democratas. Tanto os normais como os patogênicos, enfim... nem o torturador mais cruel (se lesse, às escondidas, uma tira que fosse, das sacadas “henfilianas”) seria o mesmo no dia seguinte.

A partir do Nordeste (zona de refinada alquimia, onde miséria sempre se transmuta em arte), Henfil criou personagens extraordinárias para retratar, com uma riqueza e um humor sem precedentes, a história surreal de um país inteiro. Henfil. Mineiro nascido Henrique de Sousa Filho, na Vila n¼ 21 de Neves, região metropolitana de Belo Horizonte. Henrique, mesmo nome do pai, também pai do Betinho. Betinho, quase substância do sonho brasileiro, o “sociólogo esquálido”, segundo o gordo Delfim Netto; o primeiro santo ímpio brasileiro, segundo alguns amigos. Aquele que mandou às favas o academicismo estéril com a sua Ação da Cidadania contra a Miséria e pela Vida, mobilizando este bruta Brasil. Bom... Henfil. Como discar o número? Dizer não sei que lá? Certo, eu diria que na faculdade a turma da pesada reproduzia, conforme o assunto, algumas tiras da revista O Fradim, no nosso boletim, Bóia Fria. Depois, diria que, na época, revirava a imprensa alternativa em busca das charges, das histórias da Graúna, a pássara magrinha e pretinha, síntese magistral de todas as mulheres, de todos os tempos. Amava a Graúna, ela me humanizava, eu me sentia menos culpada de existir. E ria. Mas também chorava junto. Contaria ainda sobre as cartas que ele escrevia de Nova York pra mãe, dona Maria da Conceição, cartas publicadas pela imprensa daqui. Me ensinaram muito sobre o meu país, me aproximaram mais de minha própria mãe e de minhas filhas.Acabei por não dizer nada disso. Aguardei alguns dias, noites de insônia. E, num repente, liguei. Ele, ele próprio atendeu.


Não sei como, nem sei de onde, fui incisiva, direta: meu nome é fulana, peguei seu telefone com beltrano e quero entrevistá-lo com tal objetivo. Alguns segundos de silêncio. Então, ouvi apenas: “Quando?” “Amanhã... (eu mal respirava)... pode ser amanhã às 9?” “Tudo bem”, ele disse. Anotei o endereço, consultei o guia. Era próximo ao HC.

O amanhã seria no dia 26 de outubro de 1983. Manhã limpa, ensolarada. Fui a pé, andando rápido, respirando forte (havia me instalado em Pinheiros, na Capote Valente). Pronto. Havia chegado. O dedo indicador mal tocou a campainha. Ele abriu a porta. Não me lembro do teor do cumprimento. Mas havia muito silêncio. Como aquelas igrejas sozinhas, perto de alguma cidade interiorana. Caminhei pé ante pé, a uma distância mínima dele, talvez um palmo aquém, sentidos a mil. 


Henfil ia vagaroso pelo corredor; andava com dificuldade (um tigre/quando caminha pelas pedras/vai/como pisando pétalas – o poema saiu de algum lugar dentro de mim, bem ali). Entramos num compartimento claro, sol batendo na janela. “Com licença.” (A voz dele soou como minidecreto lapidar e, num gesto simultâneo, quase imperceptível, retirou do meu rosto os óculos escuros. Até aquele momento, sem me dar conta, eu me escondia.) Imóvel, fixou o olhar no meu, um olhar percussor, operação atômica ligando fios, compondo algum novo sistema de reconhecimento. Claro, não se pode penetrar na natureza do outro sem que a nossa própria se dê a conhecer. Teoria quântica, visão mística, intuitiva... não importa. A entrevista se perdia como significante e entrava em cena uma outra dimensão, um estado inusitado de sincronismo, a certeza de um encontro com jeito de predestinação.Ele se sentou com certo desconforto, inchaço, dores fortes num dos joelhos. Mas o rosto era sereno, desarmado, os olhos já antecipando revelações. Liguei o gravador. E teve início uma estranha viagem. Henfil, o criador, o visionário, fez o retorno e veio trazendo a si mesmo. Desde quando? Me veio um sentimento imperioso de responsabilidade, como uma prova. “Atenção, e toma antes o caminho da direita, no qual está, para te ajudar, o lago da memória.” Com sua brancura quase transparente, poderoso na voz e nas palavras, Henfil me lembrou o mito de Orfeu, que, a bordo da “branca nave” (Argo), partiu em busca de uma consciência mais elevada e ampliada, passando por duras provas. Com seus companheiros (heróis e filhos de heróis, semideuses – que, numa rápida transposição, bem poderiam encarnar a nós próprios, esses argonautas, personagens da arte de Henfil), Orfeu foi à procura do Velocino de Ouro, a essência da alma. Mas esta é uma longa história. Henfil, um alquimista. No seu trabalho, o mágico e o fantástico eram aliados do real, revelações desse sentido plural da alma brasileira, que carnavaliza as próprias penas, que paga a peso de plumas o chumbo que leva. Cada movimento negado a si por conta da hemofilia, ele o forjou e modulou em figuras resplandecentes e ilimitadas, figuras completamente apaixonadas pela vida .Eu não saberia concluir o que escrevo agora. Na despedida, levei o Diário de um Cucaracha como presente. Na dedicatória, o desenho, em caneta Bic, de uma barata imensa e abusada. Voltei pra casa sem saber muito bem o que sentia. Sabia apenas que era uma vez. Uma só. E eu era outra coisa.Ao me aproximar da minha rua, ouvi uma gargalhada endoidecida e fui me aproximando. Era Teresa, uma negra imensa de voz trovejante (cantava o tempo todo) que morava ali, numas caixas de papelão. Teresa estava sentada sobre uma caixa de maçã ao lado de uma banca de revistas. Tinha nas mãos um velho Fradim e, quando cheguei perto, vi. Era a Graúna.


Como você chegou até aqui? É difícil ser Henfil?


O por que fazer, o que fiz... como aconteceu... a palavra que vem é morte, é a palavra-chave; na maioria das pessoas, a consciência da morte vem aos poucos. Tem a morte de alguém, evita-se falar de morte; para crianças, tem os simbolismos: “foi pro céu”, “vovô foi prum país muito distante”, a morte não é uma coisa presente para as crianças em geral, se bem que criança pobre tem essa consciência muito rápido. Pra mim, apesar de não ter nascido na favela, não ter nascido no Nordeste, a consciência da morte era muito precisa porque todo mundo olhava aquela criança que nascia e dizia: “Coitadinha, vai morrer, nossa, que sofrimento vem aí”. Quer dizer, mesmo que não entendesse, eu sentia a barra e a barra era: “Vai morrer por causa da hemofilia”. Naquela época, em 1944, ninguém sabia direito o que era isso nem que o nome era esse; era apenas uma criança que nascia com uma deficiência no sangue, qualquer tipo de machucado o sangue ia saindo até a pessoa morrer. O fruto disso foi que peguei uma consciência de morte, ou seja, de urgência. Viver é uma tarefa urgente porque amanhã é uma coisa que não dá pra pensar, não dá pra fazer planos, hoje é urgente, o amanhã é a morte, ontem, graças a Deus teve ontem! Claro que isso desenvolve um comportamento que nas universidades eles chamam de psicologia: de sensibilidade e de vigilância total. Andar é uma tarefa para profissionais, o mesmo preparo que o Nelson Piquet tem pra pilotar eu tinha que ter pra andar, não podia falhar. A convivência também era uma tarefa pra profissional, equivalente à de qualquer pessoa que participe de uma batalha, na guerra; então, eu tinha que saber rastejar, tinha que parar de respirar, tinha que perder meu cheiro às vezes para não me denunciar e sofrer represália e a morte. Tudo isso fazia parte de uma criança; a sensibilidade vem daí. Se na nossa sociedade a perda dos sentidos – audição, olfato, visão – é uma coisa que “não prejudica” (todo mundo perde isso em função da civilização), se a pessoa continua sua vida normalmente, adquire erudição, vive através dos livros, do cinema, da orientação de um líder, de um pai/mãe, de uma religião, pra mim isso não bastava, eu tinha que ter o controle manual nas minhas mãos e não deixar nunca no piloto automático da orientação externa, porque minha orientação era especial, logo, eu tinha que ter o meu próprio controle. Por isso eu desenvolvi uma visão maior que o normal, uma visão de índio, um olfato de índio, uma audição de índio. Vamos exemplificar melhor: se você ouve um barulho atrás de você, você simplesmente vira o rosto e olha pra constatar o que é. Eu pulo. Me coloco primeiro fora do alcance daquele barulho e depois olho. Um dia eu estava sentado na banheira, lá no Rio, fazendo a barba, quando senti o início de um chiado que prenunciava uma explosão, pulei e atrás de mim explodiu o aquecedor, que não me atingiu. Outra vez, tô dirigindo e tem uma lombada e, sem que eu perceba, jogo o carro no acostamento e atravesso a lombada no acostamento, quando chego em cima do acostamento vem vindo um ônibus na contramão... Os meus sentidos são mais desenvolvidos que o normal. Se você sai comigo de carro vai levar um susto, tomo determinadas atitudes bruscas no volante que pra você são atitudes inexplicáveis, mas logo depois você vê que alguém fez alguma coisa ali na frente que nem eu nem você vimos, mas o corpo sente, que é a coisa de precisar dar o pulo antes. Observo as pessoas, interpreto as pessoas e procuro computar todos os dados rapidíssimo, para prever o comportamento delas, porque, se houver alguma coisa agressiva, eu já tô na defesa há muito tempo, já tô fora do alcance do ataque. Então, essa é a infância, essa é a adolescência e, quando você chega a adulto e que, óbvio, não há tantas ameaças e você tem o conhecimento do teu lado e você vai trabalhar, isso tudo passa pro teu trabalho. Então, quando vou desenhar, vou criar, a minha percepção das pessoas me parece mais disciplinada que a de qualquer outro artista. Quando vou escrever é a mesma coisa, as palavras pra mim não são gratuitas, não consigo usar nenhuma palavra de forma gratuita. Estamos conversando aqui, eu vou escolhendo. É como se eu estivesse lá na frente puxando as palavras. Claro que isso vem dessa deformação de alguém que foi treinado pra andar no meio da selva e de repente anda na cidade e fica feito aquele vovô Fracolino, do Bolinha/Luluzinha, que está sempre cercado pelos índios, quer dizer, eu tô mais ou menos desse jeito. E aí, todo um trabalho, que no caso foi escrever, desenhar, fazer televisão, ele é muito é exato, é muito rápido, é muito sensitivo, é como se eu tivesse me transformado num radar; inclusive acho que não existo como a maioria das pessoas poderia dizer: “Eu sou isso, aquilo etc. e tal” – eu não sei o que é que eu sou. Nesse exato momento, por exemplo, tô tranqüilo porque há exatos dois anos atrás senti as emissões de conturbações até na área política internacional, fico detectando o que os Estados Unidos vão ou não fazer, se houve uma invasão ontem eu já sabia, já estava previsto pelas emissões que eu havia captado. E, se por um acaso o general Newton Cruz se comporta dessa ou daquela maneira no estado de emergência em Brasília, eu já captava porque já sigo as emissões do general Cruz há muitos anos. Se vem uma onda boa, eu também já estou mais ou menos preparado pra ela. Daí se explica por que a maioria das coisas que eu faço está com dez anos na frente, não na frente em termos de vanguarda, não na frente do que aconteceu, mas quase como profecia. Por exemplo, fui pros Estados Unidos entre 1973 e 1975. Senti uma série de coisas lá, todas em relação ao Brasil. Volto, dez anos depois sai Diário de um Cucaracha, um livro que está vendendo paca. Lista dos mais vendidos, primeiro lugar na lista da Veja, mas acho interessantíssimo como as pessoas só agora descobrem algo como o que está escrito no Diário que pra mim já tem dez anos, já passou. Só hoje elas estão tomando conhecimento de como nós somos tratados pelos Estados Unidos, pelas multinacionais, de como somos baratas, de como somos cucarachas, de como eles não nos respeitam. Então, hoje, qualquer brasileiro sabe o que é ser cucaracha, mas isso foi uma vivência minha anos atrás, e o livro fica atualíssimo. Outro dia me escreveu um cara, um adolescente. Tinha uns 15 anos, morava no Rio de Janeiro, logo, era um adulto, e ele lia o Fradinho, adorava, achava muito engraçado mas não entendia nada, e guardava, e hoje, dez anos depois, ele resolve ler e fala: meu Deus do Céu, tudo que falava lá agora eu tô entendendo: o que está acontecendo, inclusive a mudança de atitude das oposições no Brasil, as táticas diferentes mais abertas para uma ação, vamos dizer, dialética ou mais contraditória, mais imprevisível, as oposições hoje no Brasil não têm mais aquela previsibilidade de antigamente e o Fradinho propunha isso dez anos atrás. Foi como quando bolei um filme em 1973 em Nova York, que se chamava Deu no New York Times e que contava o papel da imprensa na criação de fatos que não existiam mas que passavam a existir porque ela publicou; e só hoje, dez anos depois, tenho condições de realizar esse filme porque os produtores estão vendo que o filme é atualíssimo. Essas campanhas que eles vão criando sobre fatos que não existem, mobilizam a opinião pública pra cantar determinada coisa que nem passava pela cabeça do povo cantar, mas aí a imprensa diz que é o que o povo está cantando e o povo passa a cantar. Então acho que qualquer outra explicação sobre por que saí por onde saí e faço o que faço da maneira que faço tem que passar por entender isto: a morte, o sentimento de urgência e a sensibilidade ultradesenvolvida para se proteger da morte.Você se salvou fazendo o que sempre quis.


E as pessoas de que você fala, as pessoas da sua geração, como estão?


Olha, cada vez mais percebo que, na realidade, eu não estava fugindo da escola, não, eu estava fugindo da idade, talvez por isso tenha tomado tantas bombas, pra ficar junto dos que estavam vindo ainda e não tinham feito nenhuma opção. Eu me sentia muito bem com 17 anos, convivendo com a turma de 11, 12 anos, não lembro de me tratarem como mais velho, era igualzinho. E hoje, por exemplo, não consigo conviver com os da minha idade, com os de 39 anos. Ou convivo com os de 70. Meu maior diálogo no momento é com Teotônio Vilela, que está com sessenta e poucos anos, mas poderíamos dar duzentos, porque de cabeça ele tem uns duzentos anos. Tem muitos amigos assim. Agora, só consigo conviver com a turma de 20, 22. Minhas relações acabam sendo fáceis mesmo com a turma entre 16 e 20 anos. Então tem um outro mistério nesse negócio: de novo tô eu na 3» série ginasial, apesar de o meu grupo já estar na universidade! Eles, pra mim, estão mortos, chego lá, nem entro na casa, já sei como é a casa dele, a relação com a mulher, com o filho, com a profissão... ficam vendo televisão como se fosse informação de alta precisão e importância, lêem jornal com cuidado como se estivessem lendo documentos egípcios, decifrando pedras como Champolion, e não percebem o ridículo das suas roupas, dos seus hábitos, das suas casas, dos seus carros, cargos. Eles me constrangem muito e me fazem adoecer. Tenho muitos amigos que eu gosto deles, eles gostam de mim, mas as nossas relações estão cortadas por essa situação. Eles ameaçam a minha saúde, fico muito constrangido. Se a Graúna, quando fica constrangida, tem desarranjo intestinal, eu fico doente também. Não com desarranjo intestinal, mas me dá dores, eu fico com artrite!A Graúna é meio sacana às vezes.


Mas a gente se apaixona por ela... a Graúna tem alguma coisa a ver com o seu lado mulher?


Não. Inclusive, outra coisa em que não embarquei foi esse negócio do lado mulher. Descobri que realmente existem homem e mulher, duas coisas, completamente distintas. Os homens que se fazem mulheres, no caso dos travestis, são bem diferentes delas, são como homens vestidos de mulher, tomam a forma de mulher mas são homens, não adianta, isso faz parte de uma coisa que a natureza nos dá a todos, mas com muita diferença. Por exemplo, esse comportamento infantil é típico do homem... é... a criancice é típica do homem. A mulher nunca foi criança, nunca será criança. Ela vem preparada pra ser algo especial no mundo, que, no caso, é uma coisa irreversível, não há nada que possa evitar isso que é o gerar filhos. Ela é mais preparada numa série de coisas. O filho do homem é a bomba atômica, é o plástico, quer dizer, ele tem que arrumar uma outra forma. Tanto que Deus, que é homem, arrumou barro pra brincar de fazer a Terra, os seres humanos, deu o sopro, aquelas coisas... Nossa Senhora não precisou fazer nada disso. Simplesmente gerou Jesus Cristo, só isso e já fez tudo. O fato de ter um filho torna a mulher um ser adulto desde que nasceu, inclusive ela está pronta pra ter o filho, as meninas desde criança são especiais, você nota. Uma menina é muito mais viva, muito mais rápida, muito mais agressiva, muito mais inteligente do que um menino. Depois, como a disparidade é muita, o que a sociedade faz através das mães, da mulher? Ela paralisa o desenvolvimento da menina. Como? Desviando pra tarefas menores, como cozinhar, lavar, varrer chão, que é uma coisa obrigatória pra qualquer menina, ou desenvolver uma outra sensibilidade, mas fora da convivência social, como balé, piano, violino, quer dizer, paralisam a menina. O menino, por outro lado, é superativado porque em geral ele é muito bobo, é muito devagar, é mais burrinho; ele não é agressivo, é chorão, é superdevagar. Então, o que fazem? Esporte pra que ele fique mais rápido porque, se deixar, o homem fica mais fraco do que a mulher. O homem não tem estrutura física nenhuma; só tem osso, mas é através do esporte que ele fica mais forte, tanto que o intelectual, aquele que não teve uma atividade física, é muito frágil, magrinho, aquela coisa desprotegida, qualquer mulher com um tapa derruba ele. Então, o homem vai desenvolvendo, através do esporte, através do jogo, através do exército, agressividade que não tem. Ele é treinado tanto, que os primeiros dias no exército são um terror pra qualquer homem, mas depois ele é condicionado. À escola, só o homem ia, só o homem tinha conhecimento, lia pra que, quando chegasse aos 30 anos, fosse igual a uma menina de 15. Tanto que, antigamente, homens de 30 se casavam com mulher de 15, porque, se casassem com mulher de 30, eles estavam esmagados. Quando eles chegavam nos 50 anos, a mulher estava chegando nos 30, e eles estavam iguais, o homem era capaz de perceber. É por isso que os casamentos davam mais certo, porque não havia tanta distância de inteligência entre o homem e a mulher. No entanto, ainda assim a mulher efetivamente é mais adulta. O homem endurece o corpo à força dos exercícios físicos, através de um comportamento que a mãe influencia; se vê ele brincando de boneca, de casinha, vai dizer “mariquinha” – a mãe é que fala, o pai nem passa isso pela cabeça, o pai é o meninão que está no bar dando cuspe na parede, bebendo, se exibindo feito qualquer criancinha. Todos os pais são meninos, vão pra campo de futebol, ficam torcendo, gritando e, na hora do gol, carregam os jogadores... isso é o pai. Mas a mãe está ali vigilante, endurece o jogo com o menino, então esse menino vira o que eles chamam de homem, esse homem cumpre as suas funções, mas jamais deixará de ser menino... Ah, sim, a parte mulher, então esse homem se transforma, se embrutece, é morto como ser humano e é capaz inclusive de virar um Fleury, vira um cara esquadrão da morte. Devido a esse treinamento, mataram o menino que ele vai ser até o fim... se deixassem, a gente teria um bando de homens meninos por aí e as mulheres cuidando de tudo. Bem, quando você disse que existe a parte mulher, não é justamente essa coisa a parte menino, essa parte que dizem feminina só existe naqueles meninos que não viraram homem, que não foram transformados, torneados, exercitados para serem homens, homens fortes, homens soldados, homens músculos, homens atletas, homens massa. Só terão essa parte chamada mulher ou chamada menino os homens que escaparam do treinamento. E as mulheres permanecem nas suas funções normais, que é menina que vai ter criança e que, portanto, vai continuar convivendo com os meninos e meninas dentro dessa convivência de sensibilidade, de ter de perceber tudo pra saber se vai chorar ou não vai chorar. O homem que permanece menino, dizem que isso é a parte feminina, não tem nada a ver, apenas eles se salvaram. Agora, os homens estão sendo dispensados gradativamente dessa tarefa de lutar, porque as armas estão substituindo os homens, o soldado não está com nada; hoje, o míssil substitui milhões de soldados, então não precisa preparar o homem pra ser soldado, e com a entrada, por fatores econômicos, da mulher no mercado de trabalho produzindo riquezas etc., essas mulheres começam a deixar de ser infantis, a deixar de ter sensibilidade e, apesar de estarem preparadas biologicamente pra ser mulheres, elas se transformam violentamente, elas se transformam em seres que têm a mesma brutalidade dos chamados homens. Por exemplo, Golda Meir em Israel fez todas as guerras; Indira Ghandi fez todas as guerras e continua com o poder na Índia; guerras, massacres incríveis em cima daquelas tribos. A mulher mais perigosa na política internacional, hoje, é a Margaret Thatcher na Inglaterra, que invadiu as Malvinas, que invade o que for, que tem uma política agressivíssima, está rearmando a Inglaterra internamente, leis de exceção etc. E temos no Brasil uma série de mulheres muito mais perigosas, em todas as áreas, do que os homens; e os homens, como foram dispensados disso, tem muitos homens meninos aí. Então, o homem que está surgindo, o novo homem, é muito mais frágil fisicamente do que o homem de dez anos atrás, e temos aí uma série de mulheres fortes fazendo cooper, musculação; a dança é praticamente um treinamento físico, talvez mais rigoroso que o exército. São mulheres fortíssimas fisicamente e vão virando aquilo que o povo na sua ignorância e sabedoria diz, a mulher está virando homem e é neste sentido: endurecimento, embrutecimento, rigidez, está tendo enfarte, vão ficar carecas, está tendo todos os problemas que o homem tinha quando passava por isso. E diz o povo, na sua sabedoria, que os homens estão virando mulher e, então, sim, aquilo que se chamava mulher, que é menina, a sensibilidade, a brincadeira, você pega qualquer grupo de rapazes, parecem meninos indefesos. Eu vou fazer conferências e descubro que 99 por cento da platéia são mulheres; lançamento de livros, mulheres; quem lê os livros, mulheres; quem está no comando médio das empresas hoje, mulheres; daqui a pouco elas estão no comando total. E veja como esse negócio de lado feminino é uma brincadeira dos meninos cantores que inventaram isso pra serem mais agradáveis à platéia musical, que é constituída de mulheres. São elas que compram discos, então eles ficam paparicando as mulheres com isso “ser menino e menina”, “o meu lado feminino”, e vem o Gil, o Caetano, todas essas pessoas que são fisicamente frágeis são meninos brincalhões, daí as mulheres fortes musculadas ficam adorando e até incentivando isso, porque o homem vai ser desarmado. A mulher percebeu – a mulher especial chamada mãe – que aquele menino que era inofensivo e brincalhão e que ela ajudou a transformar em soldado perigoso, esse homem ameaçava a vida das mulheres, então parece que elas resolveram desativar isso e só vamos ter homens frágeis, pianistas. Os homens ficam estudando estrelas e as mulheres vão trabalhar, vão dominar o esquema financeiro, econômico e vão à guerra, inclusive porque vão estar mais preparadas fisicamente. Quer dizer, há uma questão aí, que falo em termos caricaturais, mas isso que é muito próximo do real e que não há condições de existir no homem o lado feminino.


Henfil, como é que você imagina, hoje, o encontro entre um punk e um hippie da década de 60?


Um encontro entre o shopping e o MacDonald’s. Os dois são produtos fabricados, fabricações de laboratório. Não vejo o menor conteúdo político, social ou econômico nesses dois fenômenos. Eles só existiram porque são inofensivos e portanto interessam, podem ser veiculados pela imprensa, pela televisão... eu já tenho algum tempo de vida pra ter assistido a fenômeno semelhante, como o ator James Dean, de Juventude Transviada – surge um comportamento padrão para que determinados tipos de pessoas possam se enquadrar. Você veja que, de um lado, aqueles que se enquadram como punks usam roupas iguais às de seus idealizadores americanos porque qual é o punk brasileiro, por exemplo? É o trombadinha. Então, o produto estrangeiro veio, os caras adaptam. Agora, nós temos a grande massa que se identifica com um outro modelo que é o do corredor que usa Adidas, esportista, aquelas coisas. Enfim, o que nós temos são fábricas, os criadores se sentam em volta de uma mesa, e a partir do zero criam alguma coisa, fazem o produto e as pessoas vão lá e se enquadram no produto, consomem o produto até que uma nova fábrica tenha no seu departamento de criação uma nova idéia... as pessoas largam aquela e passam a adotar essa. É mais ou menos como se a indústria farmacêutica fizesse o seguinte, e faz: cria o remédio, depois cria a doença. Até fiz um cartum que é assim: um cientista chegando pro dono do laboratório, falando: “O seu remédio foi aprovado, agora o nosso departamento de marketing está estudando a criação da doença”. É isso que a gente vê por aí. Meu filme Deu no New York Times é exatamente sobre isso, como é que você cria alguma coisa que não existe e as pessoas passam a se comportar a partir daquilo. No caso, vou criar uma notícia sobre um fato político, uma nação inteira passa a adotar o que é dito. Você veja como de repente a Sony lança o walkman e todo mundo passa a usar o walkman. Bem, resolveram criar a discothèque. Bolaram todo um plano, depois criaram alguns filmes. Aqui no Brasil juntaram alguns compositores, pegaram As Frenéticas e criaram o Dance, Dance sem Parar... veio a Rita Lee e entrou, veio Gil e entrou, veio Caetano e entrou, todo mundo entrou, prepararam e todo mundo saiu dançando, e pra isso precisava um tipo de sapato que era meio de saltinho alto, meia colorida comprida, um tipo de saia, um tipo de bustiê, um tipo de coisa amarrada na cabeça, óculos multicoloridos; e os homens, a camiseta, com os braços de fora, um cintão, um botinão, uma calça superjusta e colorida, enfim, como o Travolta aparecia no filme. E aí todo mundo saiu consumindo isso. E muito dinheiro foi ganho pelos produtores dessa cultura dita universal. Você pode, inclusive, comprar ações dessa cultura, você vai na bolsa de valores e pede: “Eu quero ações dessa nova cultura que vem aí”. Então eles falam: “A nova cultura é Rhodia”. Você compra ações da Rodhia e aí você vê grandes nomes da música, da literatura e do cinema que passam a ser empregados dessa Sociedade Anônima Cultural.Com tudo isso, fala-se em final dos tempos, final de milênio... como é que você faria um cartum sobre isso? Eu não aceito esse negócio de milênio. De repente, nós aqui, a partir do nascimento de Cristo, comemorando o ano 2000 depois de Cristo. Ora, ora, ora, os orientais estão comemorando o ano 20000, os judeus comemoram não sei se o ano 4000, por aí. Os índios comemoram o quê? Um milhão? As pedras comemoram o quê? O ano 1 trilhão? As águas, que ano estão comemorando? Ora, ora, ora, diria o Teotônio Vilela quando fica irritado, não há milênio coisa nenhuma! Como é que há milênio se neste exato momento nós temos um satélite, maravilha da tecnologia, girando em torno da Terra, que possibilita as comunicações por telefone a distância, o DDI, o DDD; pois bem, vamos pegar um telefone desses, vamos levar esse telefone, como já está sendo levado, como a maravilha da tecnologia, e vamos ao sertão do Piauí e colocamos na boca do sertanejo pra que ele dê testemunho dessa maravilha, dessa tecnologia. O que é que ele vai falar? Ele vai falar: “Socorro!” É pra isso que serve a tecnologia, pra aproximar do primarismo que a gente está vivendo. Então não existe ano 2000, não adianta computador, se ele vai computar quantas pessoas, quantas crianças morrem em mil de fome, de sede, quer dizer, nós não temos água garantida pra todo mundo, apesar de ter água. Então, isso de milênio é mais uma promoção do departamento de marketing da Sociedade Anônima Cultural, é uma farsa. Não entro nessa sociedade anônima, não compro ações do shopping center, não pertenço ao shopping center; as pessoas entram, eu saio. Tem esse negócio chamado década, década de 60, década de 70... que década o cacete! Não existe isso. E eu não tenho 39 anos. Eu tenho milhões de anos, já tenho conhecimento mínimo suficiente hoje pra saber que sou fruto genético de uma ameba. Não sou filho de dona Maria da Conceição. Sou filho de uma ameba há trilhões de anos. Não tenho 39 anos, tenho trilhões de anos.


E tem planos? Quais são seus planos? Planos?


Tenho. Esticar a minha vida o máximo possível – e é possível – desde que eu viva intensamente os meus segundos, então tenho urgência. Meu plano é: se vou morrer, não tenho tempo a perder. E, como sou herdeiro de uma simpática ameba há trilhões de anos, tenho que dar seguimento a isso rapidinho porque não quero ser como a gente vê no Fantástico, aqueles milhões de células, milhões de espermatozóides querendo fecundar alguma coisa; e uns vão parando no meio do caminho, se distraem, não prestam atenção, se perdem e aí não fecundam! Eu quero fecundar alguma coisa, então tô com muita pressa e tô prestando muita atenção porque a minha morte vai se dar no dia em que eu fecundar alguma coisa.


Você tem medo da morte?


Não. Eu tenho medo é de avião.





Obras do Henfil, além das histórias em quadrinhos


Teatro - A Revista do Henfil (em co-autoria com Oswaldo Mendes)


Cinema - Tanga - Deu no New York TimesTelevisão - TV Homem, do programa TV Mulher, na Rede Globo


Livros - Hiroshima, meu Humor (1976) Diário de um Cucaracha (1983) Dez em Humor (coletiva, em 1984) Diretas Já (1984) Henfil na China (1984) Fradim de Libertação (1984) Como se Faz Humor Político (1984) Cartas da Mãe (1986)