27/9/2011 - 09h40
por Ricardo Voltolini*
Para abrir este artigo, recorro a C.K. Prahalad, famoso guru do management, falecido em abril de 2010. Em seu último – e hoje célebre – artigo para a Harvard Business Review (setembro de 2009), o autor de A Riqueza na Base da Pirâmide
debruçou-se sobre o tema da sustentabilidade nos negócios. E mais
especificamente sobre a sua correlação com a inovação. “Os executivos de
empresas vivem divididos entre escolher os benefícios sociais do
desenvolvimento de produtos e processos sustentáveis e os custos
financeiros de fazer isso”, escreveu no texto assinado também por
Nidumolu Ram (InnovaStrat) e MR Rangswami (Eco Corporate Forum),
destacando a “falsa” visão dicotômica centrada na mentalidade do
“ou/ou”, como se não fosse possível ser rentável e sustentável ao mesmo
tempo.
No brilhante artigo, Prahalad menciona estudo com
experiências de 30 grandes empresas nas quais a sustentabilidade tem
representado um filão de inovações organizacionais e tecnológicas. “Ao
incorporar o respeito ao meio ambiente no negócio, a empresa reduz os
insumos e, portanto, os custos. Além disso, um processo ambientalmente
mais responsável gera receitas adicionais a partir de produtos melhores,
permitindo criar novos negócios. Empresas inteligentes estão tratando a
sustentabilidade como uma nova fronteira da inovação”, pontificou, com a
lucidez de praxe.
Pensador provocativo, o indiano ressaltou o que
tem ficado cada dia mais evidente para a maioria das empresas líderes
de mercado: a sustentabilidade influenciará o cenário competitivo. Por
conta dos imperativos do aquecimento global e do esgotamento dos
recursos naturais do planeta, mas também em decorrência do maior valor
atribuído ao tema pelas sociedades, consumidores, governos e mercados,
as corporações estão sendo impelidas a mudar seu modo de pensar e agir
em relação a produtos, tecnologias, processos e modelos. “Ao tratar o
tema como um objetivo, as companhias que largarem à frente desenvolverão
competências e pressionarão seus concorrentes a também fazerem o mesmo.
A vantagem competitiva estará no lugar certo. A sustentabilidade será
vista, cada vez mais, como elemento de qualquer visão de
desenvolvimento”, explicou Prahalad. Sábio ensinamento.
Ainda de
acordo com o estudo de Prahalad, as companhias enfrentam cinco estágios
com desafios específicos e adaptações complexas. O primeiro diz respeito
a identificar uma oportunidade clara. O segundo, a tornar as cadeias de
valor sustentáveis. O terceiro, projetar produtos e serviços
sustentáveis. E, o quarto, conceber novos modelos de negócio. O quinto
tem a ver com a difícil tarefa de criar “plataformas de próximas
práticas”, uma espécie de ampliação do patamar de aspiração, um
paradigma além do óbvio, centrado na capacidade de inovação e de criar o
futuro não mais a partir de elementos do passado. “Para criar inovações
relacionadas a novas práticas, os gestores devem questionar as
suposições implícitas nas atuais. Esse comportamento foi o que nos levou
à economia industrial e aos serviços de hoje”, diz.
Em reforço à
sua opinião, Prahalad lembra que as empresas inventaram carros, aviões e
submarinos ao se perguntarem se poderíamos ter transportes sem cavalos,
voar como pássaros ou mergulhar como baleias. “Devemos nos fazer
perguntas relacionadas com nossos recursos escassos: Podemos desenvolver
detergentes sem água? Produzir arroz sem água? As embalagens
biodegradáveis podem ajudar a semear árvores?”
Com base em sua provocação, arrisco-me a afirmar que muitas empresas – algumas retratadas na matéria especial desta edição de Ideia Sustentável
– já estão tentando construir, na prática, respostas para as muitas
perguntas sobre novas matrizes energéticas, economia de recursos,
substituição de insumos, redução de materiais, eliminação de impactos ao
longo da cadeia de valor, conservação do patrimônio da biodiversidade,
arranjos produtivos socialmente mais justos e até a revisão de conceitos
de gestão ou o questionamento de estratégias como a da obsolescência
programada.
No entanto, esta não é uma transição rápida nem livre
de resistências, porque implica subverter a inércia, pensar “fora da
caixa”, enfrentar os riscos e os custos do novo. Impõe romper com as
amarras do passado, substituindo o modelo mental baseado na ideia da
infinitude dos recursos – bem típica da era industrial – por outro que,
aceitando os seus limites, incita o gênio humano a criar o futuro com as
informações e os valores do futuro.
Abrir mão de um modelo de
negócios “consagrado” que conduziu as empresas líderes, ao longo de
décadas, com relativo sucesso – vale dizer – exige trabalhar com a
dimensão da dúvida e da incerteza. Pressupõe a coragem de desbravar, de
sair primeiro, e não no rastro da manada. Ainda que muitas empresas já
reconheçam a influência da questão da sustentabilidade na construção de
uma nova lógica de prosperidade, compreendendo racionalmente a
importância da mudança, nem sempre a realizam com a devida urgência.
É
justamente aí que emerge a figura do líder. Do líder que acredita
profundamente nos valores da sustentabilidade, que compreende a
interdependência entre os sistemas produtivo, social e ambiental, com a
ousadia para inserir o conceito na estratégia do negócio sob uma ótica
de oportunidade, a coragem para capitanear mudanças diante de
resistências e em cenários complexos, a capacidade de comunicar o valor,
persuadir, envolver, educar e construir sinergias.
Se inovar para
a sustentabilidade é o caminho, está certo que a inovação pressupõe
organizações vivas, flexíveis, menos hierárquicas, menos apegadas ao
velho binômio do comando-controle e mais educadoras, facilitadoras do
diálogo, tolerantes às diferenças.
Experiências recentes com empresas
que avançaram na inovação para a sustentabilidade – como Nike, GE e
Siemens – mostram que elas aprenderam a escutar, criaram ambiente
favorável para as colaborações vindas das bordas – fornecedores,
funcionários, comunidades – e tiveram o cuidado de identificar líderes
nas diferentes camadas da organização, estimulando novas formas de
valorização de ideias e sistemas de premiação. O mapa é conhecido.
Agora, resta segui-lo.
* Ricardo Voltolini é diretor-presidente da consultoria Ideia Sustentável: Estratégia e Inteligência em Sustentabilidade, autor do livro Conversas com Líderes Sustentáveis e idealizador da Plataforma Liderança Sustentável (www.ideiasustentavel.com.br/ lideres).
** Publicado originalmente no site Plataforma Liderança Sustentável.
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